“Toma lá, dá cá” entre Governo e Congresso está mais vivo que nunca

484

Presidente Bolsonaro condenava a prática em discursos, mas números evidenciam liberação recorde de emendas parlamentares

Victor Ximenes

O Governo Bolsonaro liberou, em seu primeiro ano, o maior valor já registrado de emendas parlamentares. Foram R$ 5,7 bilhões, quase 10% a mais que o montante pago no ano de despedida de Michel Temer (R$ 5,2 bilhões, considerando a inflação), de acordo com dados do Senado.

Aos menos afeitos à chatice das nomenclaturas técnicas, as emendas são propostas dos parlamentares para que o Governo direcione dinheiro a determinada área. Os recursos são injetados em obras de infraestrutura ou na saúde e educação, por exemplo. Trata-se de um dispositivo orçamentário legítimo, o qual, em tese, potencializa a pluralidade da aplicação de verbas.

Mas, no tabuleiro político, a emenda é um conhecido mecanismo de barganha entre Legislativo e Executivo. Para se manter popular em seus redutos eleitorais, um deputado precisa, entre outros feitos, conseguir dinheiro para entregar algo palpável, como uma estrada, ponte ou escola.

Contudo, a fim de garantir os recursos, as negociações envolvem o famoso ‘toma lá, dá cá’, sinônimo do ‘uma mão lava a outra’ e ‘me ajuda a te ajudar’. O Governo condiciona a liberação dos valores ao apoio em votações importantes e impopulares.

Para se ter dimensão, só no mês de votação da reforma da Previdência, o Planalto empenhou R$ 3 bilhões.

O presidente Bolsonaro, quando ainda era candidato, dizia em tom ameaçador que acabaria com esse costume. No entanto, qualquer um que compreenda minimamente as engrenagens de Brasília – e ele, tendo sido congressista por 28 anos, as conhece muito bem – sabe que aquela promessa era oca e não passava de verbosidade superficial para adular seus seguidores mais desatentos.

Na prática, como os números mostram, o sistema impossibilita governar sem recorrer ao fisiologismo que está cravado nas entranhas do poder. Mandato após mandato, a política se conserva crua e não deixa espaço para que discursos utópicos e demagógicos se convertam em realidade. Ainda assim, mandato após mandato, a ingenuidade dos que compram (ou fingem que compram) o blá-blá-blá continua intacta.

DEIXE UM COMENTÁRIO

Comentário
Seu nome