Almoço em Nova York escancara conluio dos Três Poderes do Brasil com mercado

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Manifestante com faixa com os dizeres “Fascista do Ano” e “Câmera da Corrupção” em ato em Nova York / Foto: George De Castro-Day/Comitê Defend Democracy in Brazil – NY

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, e o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), José Antonio Dias Toffoli, desembarcaram do mesmo carro diante da torre do Bank of America, em Nova York, no começo da tarde de 13 de maio. Juntos, o juiz e o deputado seguiram para o almoço com os chamados investidores estrangeiros na sede do banco. Nem pensaram na impressão ruim que pode causar representantes de diferentes poderes tão juntos assim, tampouco na parcialidade do mais alto cargo do Judiciário em encontro com os interesses financeiros. Na plateia, muitos brasileiros (alguns chegando direto do aeroporto, de mala e tudo), enquanto ouvia-se muito português no lobby do edifício. Aliás, nossos ouvidos afiados escutaram comentários sobre o projeto da reforma da Previdência, em tramitação no congresso. “Tá difícil”, disse um. “Será que passa?” perguntou outro.

Essa é a charada número um que os engravatados da Park Avenue e de Wall Street querem matar o quanto antes. Cerca de 120 deles se sentaram para almoçar em mesas redondas diante da mesa principal, retangular, que reuniu ainda o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, e o governador de São Paulo, João Doria. Um almoço que, na programação oficial, deveria ter contado ainda com a presença do presidente Jair Messias Bolsonaro e seu ministro da Economia, Paulo Guedes. A ausência dos dois, causada pelosprotestos que lideramos, com uma coalizão de diversos grupos americanos, foi assunto na saída do almoço.

Manifestante ergue faixas com os dizeres “Bolsonaro é fascista” e “O Brasil não é seu quintal” | Foto: George De Castro-Day/Defend Democracy in Brazil – NY

Rodrigo Maia tentou passar a impressão de que não fazia a menor diferença se eles estavam fisicamente presentes ou não. Bastava participarem ativamente das agendas importantes do país em qualquer lugar: Nova York, Dallas, São Paulo, Brasília… Obviamente, uma referência ao fato de que Bolsonaro não conseguiu vir a Nova York receber o prêmio de Personalidade do Ano entregue, anualmente, pela Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos, no Museu de História Natural, que pulou fora da cerimônia deste ano.

Protestos diários por mais de 14 grupos de ativistas e quatro grandes ONGs, patrocínios cancelados por pelo menos quatro grandes empresas e as declarações abertas e diretas do prefeito de Nova York, Bill de Blasio, tornaram a presença de Bolsonaro em Nova York absolutamente inviável, e visivelmente indesejada. Uma das petições, iniciada pelo senador estadual Brad Hoylman, cuja jurisdição cai sobre o distrito de Times Square, chegou a alcançar 82 mil assinaturas contrárias ao prêmio que seria anunciado na noite de terça-feira (14) no Hotel Marriott, pois foi o único espaço que aceitou abraçar o evento, contradizendo seus valores de inclusão e ignorando um grande número de seus clientes. A atriz Debra Messing chegou a pedir boicote à rede de hotéis em um de seus tweets.

O grupo de políticos e o juiz do Supremo Tribunal Federal tomaram lugar no almoço com o propósito de tentar apagar essa imagem ruim. “Quando você vem e tem a participação do presidente da Câmara, do Senado, do governador Doria e do ministro do Supremo, você está dizendo o seguinte: as nossas instituições estão funcionando e respaldando nosso sistema e garantindo que aquilo que for aprovado pelo legislativo será respaldado pelo sistema”, disse Rodrigo Maia.

Mas o que é óbvio é justamente o oposto. Se é preciso tudo isso para provar que o sistema funciona, que a democracia funciona, e nisso se misturam os poderes em vez de separá-los, como reza a boa democracia, e o verdadeiro Estado de Direito, é sinal de que existe muita desconfiança – e, por que não dizer, muito conluio por aí.

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, foi ainda mais longe: “Mostramos para os investidores que o Brasil vai se transformar em um Estado capaz de controlar as finanças públicas, gerar empregos e desburocratizar o Estado. Essa semana, viemos apresentar em Nova York o Brasil que nós estamos construindo”. Sinal claro de que foi de fato destruído e de que tem que ser reapresentado a um grupo de investidores brasileiros, e alguns estrangeiros, numa tentativa de construção duvidosa, e até escandalosa, em um dia de chuva em Nova York.

Manifestante ergue cartaz com os dizeres “Contra a destruição da floresta tropical, diga ‘não’ a Bolsonaro” | Foto: George De Castro-Day/Defend Democracy in Brazil – NY

Edição: Comitê Defend Democracy in Brazil

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